Acalmados os ânimos, vou partilhar convosco uma das minhas memórias mais bonitas, que teve lugar na Tunísia. Não me lembro do ano, tenho de começar a apontar nas fotografias esse tipo de dados, já que o meu cérebro não colabora. Devia rondar os 17-18 anos, também não vem muito ao caso. Há muitos detalhes da viagem dos quais também não me lembro bem, portanto isto hoje é curto.
Sei que fomos de Portugal num avião da TunisAir cujo nome tinha lá pelo meio a palavra Kacem. A coisa prometia, portanto.
Já no destino, juntámo-nos a mais umas pessoas que vieram do Porto e conhecemos o nosso guia, muito simpático mas não me lembro do nome. Lembro-me que falava português, que era vaidoso como tudo e que se vestia à arabesco mas com estilo, todo o pormenor muito bem planeado. Além do guia do grupo conhecemos também o nosso condutor, visto que íamos numa caravana de 4x4 para todo o lado. Também não me lembro do nome mas era um bastante familiar (de repente só me ocorrem Abdul e Jafar - o do aladin - mas acho que era algo parecido com Mahmud). Era mais calado, mais tímido, só falava francês, mas lá lhe demos a volta e a meio da viagem já estávamos todos à vontade.
Lembro-me do cuidado que o guia tinha em avisar-nos sempre que chegávamos a qualquer lado dos sítios onde podíamos beber sem que dez minutos depois não tivéssemos de ir a correr à casa de banho. Penso que em toda a viagem me escapei de grandes dores de barriga, já não posso dizer o mesmo do meu pai, que fez o "Mahmud" ultrapassar os limites de velocidade a caminho do hotel a pedinchar em francês porque tinha mesmo mesmo MESMO de ir à casa-de-banho ASAP. O "Mahmud", assim como o resto das pessoas no carro, ria-se, claro. Foi antes de chegarmos a este hotel:
Claro que o meu pai zarpou a alta velocidade lá para dentro ainda nós estávamos a sair do carro. É para aprender a beber só água mineral engarrafada. Houve uma parte da viagem em que o guia nos levou lá a um amigo para beber limonada, dizia ele que era a melhor e que era feita com água engarrafada. Foi um bom negócio para todos, porque de facto era capaz de ser a melhor limonada que alguma vez provei, e FRESCA (que a Tunísia é coisa para ser no meio do deserto).
Em Matmata ficámos num hotel com uma construção típica da região, onde as habitações são 'esculpidas', para não dizer 'escavadas', a partir do ambiente envolvente. De facto é do tipo de construção onde se estava melhor, era mais fresquinho e menos pretensioso que os hotéis todos xpto.
O hotel |
Uma das voltinhas na região |
Também em Matmata fomos visitar o local onde decorreram algumas das filmagens do Star Wars. No filme estaríamos então no planeta Tatooine, onde o Luke passou a sua infância com os tios.
O local das filmagens |
O Luke infelizmente não se encontrava lá, tinha ido caçar uns guardas imperiais |
Podia estar um calor infernal, mas tínhamos sempre algo com que nos refrescar, apesar de andarmos sempre dum lado para o outro:
Também andámos a ver ruínas romanas, em Cartago, andámos pelas ruas mais comerciais, onde era obrigatório regatear, apesar de eu não apreciar, vimos mercados mais tradicionais. Trouxe pouca coisa, apesar de as coisas lá serem relativamente baratas. Trouxe incenso, trouxe uns frasquinhos de perfume em vidro trabalhado para a minha mãe, lindos de morrer, e baratos, sendo que já os vi cá à venda em algumas daquelas bancas que tem 1001 coisas do género, com pulseiras e tal, e custavam o triplo, trouxe um penduricalho contra o mau olhado, uma espécie de olho azul, que andou séculos pendurado no retrovisor do carro, não por ser contra o mau olhado mas porque eu gostava mesmo daquilo, era bonito. Cheguei a ver cá à venda mas eram muito mais feios. Ainda o tenho, mas está reformado. Eram zonas bonitas, mas algumas muito turísticas.
Um belo dia, em Tunis, resolvemos pegar em nós e dar uma voltinha sem o guia. Levámos só o essencial, por segurança, e lá fomos nós. Foi engraçado, nada do outro mundo, mas resolvemos voltar para trás quando chegámos a um mercado tradicional e... bom, digamos que com aquele calor, ver carne pendurada às moscas e com uma cor (e o cheiro, senhores, o cheiro) duvidosa... ficou gravada na minha memória a imagem de uma mão de vaca pendurada, meia esbranquiçada/amarelada, com as pontas das unhas enegrecidas.
Tunis |
O calor era, por regra, infernal, mas até se aguentava bem, porque era seco. Lembro-me de uma altura, lá no meio de umas ruínas, calhaus e mais calhaus até onde a vista alcança, perguntei que temperatura estaria ao guia, ele olha para o relógio todo armadilhado que tinha e diz-me que estão 49 graus... surpreendentemente, não me lembro de ter apanhado nenhum escaldão, e oh se sou susceptível...
Quanto à comida, não tenho do que me queixar. Não comi muita carne, porque também não sou muito disso, mas comi muito couscous, de todas as maneiras e feitios. Comi bem, sempre. Nunca houve lado nenhum em que não gostasse da maior parte das coisas que me apresentavam. Foi lá que pela primeira vez vi azeite a servir de entrada, com pão. E que bom que era. Há muito olival para aquelas bandas, e bom azeite.
Mas chegamos à parte que aqui me trouxe, a melhor parte desta viagem, sem qualquer margem para dúvidas. Ksar Ghilane, um oásis no meio do deserto do Sahara (não será no meio, mas parece). E é o típico oásis que nós imaginamos. Palmeiras, água no meio e uma imensidão de areia à volta. Ainda levou bastante até lá chegarmos, lembro-me de pensar que se TODOS os 4x4 por algum motivo se avariassem ali estávamos bem arranjados. A meio caminho havia uma espécie de posto de apoio, com água e outras coisas, e tinha também lá estes amigos:
Raposas-do-deserto, ou fenecos |
Não sei porque lá estavam, não sei o que lhes iam fazer, fiquei um bocado apreensiva, mas elas estavam sossegadas e pareciam bem tratadas, e as pessoas dali não tinham mau ar...
Fizemos algumas paragens para esticar as pernas, e aproveitámos para guardar um pouco da areia do deserto para trazer como recordação. A areia do deserto é tão fininha, e varia de cor de local para local. Ainda tenho ali os frascos numa prateleira, juntamente com calhaus e conchas de outras viagens.
Chegando ao oásis, foi um deslumbramento do princípio ao fim. Fomos ver as nossas tendas, pousar as coisas, tomar um banho e trocar de roupa, para depois nos juntarmos todos para uma festa à noite. Foi lindo, uma fogueira no meio, tudo divertido, os guias e os condutores todos animados, puseram-se a dançar uns com os outros (que isso de dançar homens com mulheres lá não se usa). Foi bonito. Ainda fui à piscina dar uma de foquinha, até a piscina era linda, com água até à borda, com uma cor verde (em vez do tradicional azul) fantástica. No fim da noite, estávamos nós no bar, um dos guias perguntou ao meu grupo (éramos 6 ou 7 ou 8, já não me lembro) se não queríamos ir ver uma coisa bonita. Ninguém percebeu muito bem o quê, mas seguimo-lo. Quando começamos a segui-lo para trás de umas dunas, sem vermos um boi à frente, já estávamos preparados para lutar pela nossa vida. Até que passadas as últimas palmeiras, dei com o céu estrelado mais fascinante que alguma vez vi até agora. Sentámo-nos todos no topo de uma duna a contemplar o céu. Até hoje, sempre que me lembro disto emociono-me. Já não me lembro se ele contou alguma história, eu também de francês não pesco muito. Lembro-me de enterrar as mãos na areia e de sentir as camadas inferiores ainda quentes. Era lua nova, o que facilitou ainda mais a vista. A escuridão do deserto também. Passado um bom bocado lá fomos dormir, mas eu e o meu pai levantámo-nos cedo para ver se dávamos com aquele sítio para ver o nascer do sol. Lá fomos nós, eu ainda fui com a camisola do pijama, que mal abria os olhos. Dei por mim a reparar que no caminho havia imensos trilhos de bichos rastejantes, pelo que na noite anterior não estávamos sozinhos, deviam estar milhares de bichos à nossa volta, mas tudo bem, aproveitei muito melhor assim, sem estar com a preocupação em manter-me viva no meio de cobras e escorpiões. Bom, para dizer a verdade só vi grilos e escaravelhos... mas não interessa. O nascer do sol não foi tão interessante como o céu estrelado, mas foi uma visão bonita de qualquer modo, a imensidão de areia à nossa volta. Estava muita poeira no horizonte, pelo que o brilho do sol estava perfeitamente suportável para olhar directamente, pelo menos até certa altura. Ksar Ghilane é um must-see se forem um dia à Tunísia. Parece que também há boas praias, mas essas não me calharam na rifa. Quem sabe se um dia lá voltar... Podem ver mais fotos aqui (cliquem nas fotos e vejam a galeria toda) ou aqui (link), mas deixo-vos algumas minhas de Ksar Ghilane para terminar:
o acampamento |
a toca de um ser rastejante, como o grilo aqui à esquerda, e os trilhos característicos |
4 comentários:
Bela descrição, Elsa. Nunca fui, sempre evitei ir a África - o culpado foi um conhecido que me falou uma vez de uma viagem à Zmauritânia- mas já me falaram muito bem da Tunísia. Fica para uma próxima (belas fotos?)
(fiquei muito contente por ver que estás melhor :). )
:) Obrigada Vic :)
A Tunísia foi a minha única experiência no continente africano, mas gostei bastante. Será bastante diferente da Mauritânia, tem muitas influências mediterrânicas e está muito virado para o turismo também.
Aquele oásis é qualquer coisa...
Agora fizeste-me recordar também as minhas férias na Tunísia, país de que gostei muito e espero voltar, o que mais gostei foi da parte do deserto que é espectacular, quanto à comida é que não gostei nada tirando uma refeição ou outra, vim de lá mais magra e tudo, mas no geral adorei.
Belo reporte.
Não conhecia aqueles seres chamados de raposas do deserto ou o raio que eram.
Viajar nunca é demais.
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